domingo, 24 de julho de 2011

Obsessão

   Estávamos escorados no parapeito e olhávamos a pequena mancha no asfalto.
   Preferi dizer-lhe que seu gato himalaio havia se lançado da sacada. E ela preferiu se fazer acreditar, talvez evitando chocar-se ainda  mais.
   –Vá embora. – foi só o que disse.
   Eu saí. Entrei no elevador e apertei o térreo.
   Quando chegou, pensei em voltar, tornei a entrar e apertei outra vez o nove.
   Mas quando retornou, desisti, e voltei a apertar o térreo.
  
   Saí pela calçada e alguns passos depois avistei o bichano espatifado no acostamento.
   – Todos nós saímos perdendo – disse, ante o amontoado de pelos e tripas.
   Pobre animal.
   Andei por mais algumas quadras e sentei-me ao balcão de um bar. Não estava disposto a beber, então pedi um café.
    Logo percebi que em uma das mesas, uma jovem bebia sozinha.
   Peguei meu café e me aproximei.
   –Posso me sentar?
   –Sim. – não hesitou.
   
   Tão logo começamos a conversar percebi que ela tinha pequenos tiques nervosos, que é claro, preferi fazer de conta que não percebia.
 
    –O que você faz? 
    –Sou professor – menti.
    Sei que elas nunca se interessam por um ajudante de cozinheiro.
  
   Descobri que o seu nome era Laura, que havia deixado a casa dos pais para estudar e que morava num apartamento alugado a uma quadra do bar.
   Bebi mais dois cafés, enquanto ela insistia num drink azul, que acabei por não saber o nome. “Mais um”, era só o que dizia ao garçom.
 
   Conversávamos sobre como as pessoas estão cada vez mais arredias umas com as outras, cada vez mais com medo uma das outras, sempre acreditando que a pessoa que se aproxima é algum tipo de malfeitor... e essas bobagens todas...
   Quando ela levantou-se subitamente.
   –Vou ao banheiro.
 
   Observei-a levantar-se já demonstrando sentir o peso dos drinks azuis e enquanto a observava no trajeto até o banheiro, percebi que em sua blusa preta haviam grudados alguns pelos que se destacaram sob a luz.
    –Laura... Não posso confundir o nome – sussurrei. 
    Logo ela voltou e sentou-se, praticamente atirando-se sobre a cadeira.
   –Mais um – disse outra vez.
   –Gosta de animais? – fui perguntando.
   –Adoro! – disse sorrindo.
   –Tem algum?
   –Tenho um gato siamês.
   –Gatos são bons pra se ter em apartamento – prossegui.
   –São sim. São ótimos!
   –E em que andar você mora? - sondei.
   –Moro no primeiro. Sabe como é... Não gosto muito de altura.
   –Sei.
   Aproveitei enquanto ela bebia outro gole do drink azul e coloquei o dinheiro dos cafés sobre a mesa. Levantei-me e fui saindo.
   –Aonde vai?
   –Já é tarde. Amanhã começo cedo na cozinha do restaurante.
   –Mas não disse que era professor?
   –Esquece. 

Do livro “Brincadeira Extemporânea” – S. L.
BN - Registro 462.194  - Obra não publicada.

Reencontro

  Dois anos depois ela voltou...
  Cinco quilos mais magra, e com a buceta inchada.
  Tive-a como quem cumpria tardiamente uma etapa essencial.
   –Sabia que não me esqueceria.
   –Sou teimoso.
   –Ele era seu amigo, não era?
   –Sim.
   –Odeia ele?
   –Não.
   –Então não gostava de mim?
   –Acho que gostava – disse, enquanto cuspia a ponta de uma unha.
   –E não o odeia por ter me levado pra longe de você?
   –Não.
   –Vai dizer que não gosta mais de mim? – então me cutucou as costelas.
   –Nervozinho. – me disse, tentando brincar.
   –Ele me ensinou como se trata uma vadia.
   Ela não se desconcertou.
   Queria que ela gritasse, esbravejasse e saísse batendo a porta. Mas não o fez. Ao invés disso sorriu maliciosa, beijou-me o peito e o pescoço e me sussurrou ao ouvido:
   –Vai dizer que não me quer mais?
   –Prefiro as tetas de uma cadela magra – disse tranquilo e convicto.
  Ela se levantou e vestiu a roupa.
  Outra vez não gritou.
  Saiu, e não bateu a porta.

Do livro “Brincadeira Extemporânea” – S. L.
BN - Registro 462.194  - Obra não publicada.

sábado, 23 de julho de 2011

Cartão Postal

Abro a minha janela e vejo a grande indústria. 
Branca, fervilhando, expelindo a fumaça que encobre parte da cidade
Vejo a grande caixa d água e imagino como está lá por dentro
Silenciosa, escura, pronta para embalar a morte
As pessoas se enfileiram para entrar, e viverem mais um de seus dias, enquanto do outro lado animais se enfileiram para cumprir a última etapa de sua criação
E eu me sento com um sanduíche de carne, comendo, enquanto imagino...
Posso ver os porcos, morrendo, tendo suas tripas arrancadas, depois sendo moídos e enfiados nas mesmas tripas...
Parece-me o pior dos fins
São porcos
Posso ver as luzes do refeitório
Vejo vultos brancos
Parecem agitados enquanto socam comida garganta abaixo
Não são porcos
Todos têm a mesma cor agora, se portam iguais, são regidos, tem seus lugares escolhidos e sua comida também, parece-me que estão sendo preparadas para o abate
Mas ainda não são porcos
Foram criados e vivem para a indústria
Não sei como chamá-los
Tenho amigos que entram naquela fila
Estão todos gordos e fortes
Riem quando eu falo essas coisas
Outro dia houve uma morte diferente na indústria – contou-me um -
Um dos funcionários matou o outro usando a mesma faca que usava para os animais
“Vivia me chamando de negro filho da puta! Aquele porco!” – disse o que matou
Enfim, de um, nada se aproveitou - pensei
Mas não falei
Estão realmente fortes
Amanhã acordo mais tarde
E sei que quando abrir minha janela, muitos dos que já estiverem voltando de lá vão me olhar com desaprovação – “vagabundo” – dirão baixinho
Sem ao menos saberem do precioso tempo que dediquei a eles
E que pensei neles, e em suas vidas, enquanto fumava um cigarro
Quem mais faria isso?   

Do livro “Brincadeira Extemporânea” – S. L.
BN - Registro 462.194  - Obra não publicada.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Sorte...

   –Tem um cigarro? – falou enquanto eu me apressava.
   Aquilo não foi nada agradável de se ouvir.
   Não naquele lugar.
   Não após o que ainda me ecoava aos ouvidos.
   Dei alguns passos na direção em que imaginei ser a contrária.
   –Tem um cigarro? – tornei a ouvir.
   Parei e resolvi falar como se estivesse tranquilo.
   –Tenho. Mas é só o que posso te arranjar.
   Puxei o maço de cigarros do bolso, segurei um entre os dedos e estiquei o braço.
   Como a fisgada de um peixe pequeno, senti quando pegou.
   Logo um isqueiro se acendeu e pude ver o rosto magro, de linhas gritantes, que apesar da situação, transparecia calma.
   –Esperando alguém? – perguntou.
   –Não. Estava de passagem.
   –Pensei ter ouvido gritos. Você não ouviu?
   Eu sabia que toda a minha sorte estava naquela resposta.
   –Não.
   –Se eu fosse você, sairia logo daqui.
   Acatei sem mais pensar.
   Nada mais aconteceu antes que eu saísse de lá. Mas até hoje, por mais distante que eu esteja, não há um só dia em que não volte àquele lugar.





Do livro “Brincadeira Extemporânea” – S. L.

BN - Registro 462.194  - Obra não publicada.

Aline

                                                                              
                                                               Aline
26/06/10 04:35  
Boa noite
Anjinho...bj ate
Amanha.Aline
    ***FiIm***      
       
Aline
26/06/10 12:21
Opa...bom
dia,dormiu
bem?Ainda se
lembra de
ontem?bj Aline
    ***Fim***

Aline
26/06/10 12:26
Eu também...e isso
eh muito perigoso!
     ***Fim***

Aline
26/06/10 12:37
Eu tirei a internet
aqui em casa...meu
negocio eh ao
vivo e a
cores...hehe
    ***Fim***

Aline
26/06/10 13:01
Sim...a minha mãe
vai embora as
três da
tarde,depois
estarei sozinha e
abandonada...rs..
    ***Fim***

Aline
26/06/10 13:26
Pode ligar sim...vc
esta livre hj a
noite?ou vai me
abandonar
também?rs
    ***Fim***

Aline
27/06/10 02:56
Amei ficar
contigo.bj boa
noite e pensa em
mim...hehe
    ***Fim***

Aline
27/06/10 11:43
Bom dia meu
coração,dormiu
bem?Eu
praticamente
desmaiei...rs.Esper
o vc me ligar
então...saudades.b
j
    ***Fim***

Aline
27/06/10 16:13
Porque eu não
consigo tirar
voce do meu
pensamento? med
o!!
     ***Fim***

Aline
27/06/10 18:47
Saudades
saudades e
saudades
    ***Fim***

Aline
27/06/10 19:26
Tu acredita que
eu nao tive
coragem de ir na
farmácia...eh
essa sou eu...
corajosa p
algumas coisas e
cagona p outras!
     ***Fim***

Aline
28/06/10 00:33
Nao
precisa!!!Amanha
eu vou na
farmacia...nao te
preocupe eu
sempre me virei
sozinha!!!Deixa
quieto.Ate mais
     ***Fim***

Do livro “Brincadeira Extemporânea” – S. L.
BN - Registro 462.194  - Obra não publicada.